quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Tragedia no Rio de Janeiro

Hospitais do Rio recebem primeiro lote de insumos doados pelo governo federal
  • 24/12/2015 14h41
  • Rio de Janeiro
Akemi Nitahara - Repórter da Agência Brasil*


Medicamentos e material hospitalar doados pelo governo federal chegam ao RioFernando Frazão/Agência Brasil

Após decretar estado de emergência na saúde na noite de quarta-feira (23), o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, recebeu nesta manhã, no Hospital da Lagoa, material médico doado pelo Ministério da Saúde.

Um caminhão com o primeiro lote de insumos foi levado para o Hospital Getúlio Vargas, na Penha, de onde o material também será distribuído para os hospitais Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, e Alberto Torres, em São Gonçalo, na região metropolitana. No total, o ministério vai doar R$ 20 milhões em produtos destinados à saúde para o governo do estado.

Segundo o futuro secretário de estado de Saúde, Luiz Antonio de Souza Teixeira, que está comandando o gabinete de crise instituído ontem e assume oficialmente a secretaria em janeiro, serão divulgados boletins diários a partir de amanhã (25) para informar a população sobre o andamento das ações emergenciais e sobre que unidades as pessoas podem procurar quando precisarem de atendimento.

“Vamos passar, todos os dias, a real situação das unidades. Nossa primeira preocupação é a retomada das emergências hospitalares. Já temos as maternidades em pleno funcionamento e a grande maioria das UPAs [unidades de pronto-atendimento] com o seu atendimento. A partir do gabinete de crise, qualquer esforço que a gente tiver, a gente vai usar qualquer recurso. A gente não vai reservar nada para amanhã, para a Olimpíada, para qualquer evento: ttudo que a gente tiver vai estar na rua, à disposição da população”, afirmou Teixeira.

Reestruturação do setor


O futuro secretário disse que é preciso rever a rede de saúde do estado para readequá-la à atual situação financeira. “Precisamos de um novo modelo de saúde no Rio de Janeiro, que caiba na condição financeira do estado. O estado do Rio tinha uma condição financeira e formou uma rede espetacular, institutos especializados, unidades de pronto-atendimento, hospitais de porta aberta, e precisamos hoje que isso caiba na nossa realidade financeira. Vamos readequar o que o estado do Rio de Janeiro tem de recurso para o que vamos prestar de serviço, privilegiando o atendimento de emergência.”


Ao  lado  do  secretário  de  Atenção  à Saúde, Alberto Beltrame, Pezão diz que será possível entrar em 2016 com  tranquilidade   Fernando Frazão/Agência Brasil

De acordo com o governador, em uma semana, os pagamentos atrasados estarão em dia, e o atendimento deve estar normalizado em toda a rede após o estado receber uma ajuda de R$ 300 milhões. “Ontem, começamos a pagar – é claro que os recursos não entram imediatamente na conta das pessoas – mas as organizações sociais [OS] já estão começando hoje a pagar os enfermeiros, os médicos." Pezão disse esperar que, a partir de segunda-feira, todos os pagamentos estejam normalizados. "Não é o ideal, mas o mínimo que nos pediram para a rede funcionar. Conseguimos ir além do mínimo e colocar o dobro do que foi pedido, mas ainda está longe do ideal.”

Para o governador, será possível entrar em 2016 com tranquilidade e atendendo a população, embora haja necessidade de reorganizar a rede de saúde no estado.

Ele informou que pediu um encontro com o secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Alberto Beltrame, o ministro Marcelo Castro, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, os prefeitos da região metropolitana, considerando a competência de cada um. "O estado não vai fugir da sua responsabilidade, mas vai se dedicar especialmente à média e à alta complexidade, que são obrigações do estado. Quero definir muito isso em 2016, logo nos primeiros dias de janeiro”, afirmou Pezão.

Na entrega do material, o secretário Beltrame informou que serão passados para o estado cerca de 300 mil itens de material de consumo variado, como luvas cirúrgicas, esparadrapo, agulhas e próteses ortopédicas. Ele disse que o ministério também vai colaborar com a reestruturação da rede estadual. “[A entrega dos insumos] é uma forma de dar concretude a esse auxílio que, além de financeiro, é técnico e material. Estamos solidários com o povo e com o governo do estado e nos colocando à disposição inclusive para auxiliar tecnicamente na reorganização, na reestruturação da rede de saúde do estado."

Os hospitais federais instalados no Rio de Janeiro, que dispõem de 1.500 leitos para ajudar no atendimento à população, receberam, até o momento, 25 pacientes que estavam internados na rede estadual.
Ao todo, a saúde do Rio de Janeiro vai receber, nas próximas semanas, R$ 100 milhões por meio de convênio firmado com a prefeitura da capital, R$ 135 milhões do Ministério da Saúde, divididos em três parcelas. e R$ 152 milhões de receita prevista do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

O gabinete de crise volta a se reunir hoje (24), e a situação de emergência têm prazo de 180 dias.
*Colaborou Nanna Pôssa, repórter do Radiojornalismo
Edição: Nádia Franco


sábado, 5 de dezembro de 2015

O incrível modelo do nosso cerebro

O cérebro sujeito ao tempo


Mesmo sem alterações patológicas, envelhecimento provoca uma reorganização do funcionamento da mente
RICARDO AGUIAR | ED. 237 | NOVEMBRO 2015


Exercícios físicos, além de uma vida intelectualmente estimulante, ajudam a manter a juventude cerebral










Assim como a pele ganha rugas e os cabelos ficam brancos, o cérebro muda conforme a pessoa envelhece. São alterações estruturais e também funcionais, na forma como as diferentes regiões desse órgão se comunicam e relacionam. Resultados publicados na revista Cerebral Cortex ajudam a caracterizar essas mudanças. “Observamos que o cérebro passa por um processo de reorganização”, explica Geraldo Busatto Filho, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), um dos autores do artigo. “Funções mentais importantes exigem integração e sincronia entre diferentes áreas.”

Luiz Kobuti Ferreira, autor principal do estudo e também da FM-USP, conta que o estudo avaliou pareamentos entre 278 regiões do cérebro inteiro. Entre os três mais importantes resultados do trabalho, realizado com ressonância magnética funcional, está o aumento da associação, em idosos, entre áreas de funções diferentes que não precisariam se comunicar para realizar as respectivas tarefas. O exame, que permite ver o cérebro em funcionamento, mostrou que a área responsável pela visão, por exemplo, tem conexão fraca com aquela relacionada ao raciocínio lógico em jovens e adultos. Entretanto, conforme a idade aumenta, essas áreas passam a funcionar mais em conjunto.

“Uma das teorias sobre isso diz que certas regiões cerebrais não conseguem exercer sua função tão bem quanto antes e recrutam outras áreas como forma de compensação, o que leva a uma perda de especialização”, diz Ferreira. Esse tipo de funcionamento pode deixar o cérebro mais suscetível a ruídos, dificultando a execução de tarefas que exigem atenção ao mundo externo. Como os idosos avaliados eram saudáveis e não apresentavam problemas cognitivos, também é possível que a maior conexão entre diferentes áreas esteja relacionada à maior experiência de vida e aprendizado.

Outra diferença entre o cérebro de jovens e de idosos é uma perda de sincronia entre regiões. Durante a infância e a adolescência, algumas redes cerebrais começam a se comunicar mais entre si e passam a ficar ativas simultaneamente, enquanto regiões com funções diferentes podem fazer o processo contrário: se uma delas está ativa, a outra não está. Um exemplo são as regiões responsáveis pela atenção, ativadas diante de uma ameaça, e a Rede de Modo Padrão (Default Mode Network, em inglês), um conjunto de regiões ativo quando a pessoa está alheia ao mundo externo. Em uma parte dos idosos estudados a sincronia entre essas regiões, que é forte em jovens e adultos, fica reduzida.

Pares de regiões fortemente associadas entre si também podem se tornar menos conectadas em idosos. Essa observação foi constatada principalmente na Rede de Modo Padrão e corroborou estudos anteriores realizados com regiões específicas do cérebro.

Os achados complementam trabalhos anteriores do grupo de Busatto, que analisaram como o envelhecimento afeta o cérebro do ponto de vista estrutural. “O cérebro de idosos apresenta uma diminuição de volume que pode ser explicada por várias alterações, incluindo diminuição da densidade de conexões sinápticas, da atividade de neurotransmissores e perda dos prolongamentos dos neurônios”, diz ele.

Ainda não é motivo para se sentir derrotado. O processo de envelhecimento cerebral pode ser minimizado pela prática de exercícios físicos, por uma dieta saudável e por não fumar, além de estar bem psicologicamente e participar de atividades mentalmente estimulantes.

Outros grupos se concentram em compreender como se dá o envelhecimento não saudável do cérebro, como o de Carlos Alberto Buchpiguel e Daniele Farias, do Centro de Medicina Nuclear da USP, em colaboração com o grupo de Busatto. “Eles estão analisando pacientes com comprometimento cognitivo leve e estágio inicial de doença de Alzheimer, responsável por mais da metade dos casos de demência”, diz Busatto. “Está sendo usada a técnica de PET para fazer imagens do acúmulo de fragmentos do peptídeo beta-amiloide no cérebro para analisar, em conjunto com exames de ressonância magnética funcional, se esses acúmulos estão relacionados com mudanças nos padrões de conectividade cerebral”, explica, referindo-se a um tipo de tomografia que permite monitorar determinadas substâncias químicas no organismo.
Estudar o que acontece no cérebro em pacientes com Alzheimer é o objetivo também de Marcio Balthazar, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp): tanto alterações estruturais e funcionais que ocorrem no cérebro como as semelhanças e diferenças entre o envelhecimento saudável e o patológico.

Balthazar observa que pacientes com Alzheimer, em comparação com idosos saudáveis, apresentam uma desativação menor da Rede de Modo Padrão durante a realização de tarefas voltadas para o mundo externo, o que resulta numa menor capacidade de atenção e concentração. Ele também detecta uma maior quantidade de conexões entre áreas do cérebro que exercem diferentes funções. Conforme a doença avança, o cérebro dos pacientes diminui muito mais de tamanho quando comparado a cérebros saudáveis, e deixa de recrutar outras regiões como forma de compensação.

Prevenir e remediar
Um dos principais desafios para Balthazar é encontrar métodos para detectar a doença de Alzheimer da maneira mais precoce possível. Uma ideia é unir os padrões de conectividade cerebral com o que já se sabe sobre a deposição da proteína beta-amiloide, principal responsável pela perda de conectividade e por problemas cognitivos na doença. “Nossos resultados mais recentes indicam que é possível utilizar níveis de beta-amiloide para predizer o grau de conectividade cerebral”, explica. Ele ressalta que a ideia de utilizar a proteína e imagens cerebrais como biomarcadores tem potencial, mas ainda precisa ser refinada para ser utilizada com sucesso na área clínica.

Outro objetivo é descobrir um tratamento eficaz para a doença de Alzheimer, que hoje não tem cura. O grupo de Balthazar estuda, atualmente, se o exercício físico – que ajuda a prevenir a doença – pode ter efeito também como tratamento. “Resultados preliminares indicam que exercícios físicos têm potencial para retardar não apenas o aparecimento, mas também a progressão da doença.”

Projetos
1. Recuperação de memória autobiográfica e envelhecimento cerebral: um estudo através de ressonância magnética funcional (nº 2011/00475-3); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Geraldo Busatto Filho (FM-USP);Investimento R$ 69.463,87.
2. Neurociência translacional da doença de Alzheimer: estudos pré-clínicos e clínicos do peptídeo b-amiloide e outros biomarcadores (nº 2012/50329-6); Modalidade Projeto Temático; Pesquisador responsável Geraldo Busatto Filho (FM-USP);Investimento R$ 3.082.570,79.
3. Biomarcadores na doença de Alzheimer e comprometimento cognitivo leve: estudo de métodos de ressonância magnética funcional e marcadores liquóricos e plasmáticos (nº 2011/17092-0); Modalidade Jovens Pesquisadores; Pesquisador responsável Márcio Balthazar (FCM-Unicamp); Investimento R$ 226.940,05.
Artigo científico
FERREIRA, L. K. et alAging effects on whole-brain functional connectivity in adults free of cognitive and psychiatric disorders.Cerebral CortexOn-line. 26 ago. 2015.